Nós temos uma série de direitos que precisam ser protegidos pela Lei para que não sejam violados.Um deles, e talvez um dos mais importantes, é o direito à moradia, que vai além do que comumente falamos “ter um teto para morar”. Esse direito busca garantir a qualquer pessoa o mínimo que ela precisa para existir, ocupando um imóvel e tornando-o a sua residência, seu lar, um lugar para habitar e nele permanecer com segurança e dignidade humana.
Tanto é assim que o imóvel onde o indivíduo mora juntamente com sua família é considerado e chamado bem de família, tão importante a ponto de ter uma lei específica que o protege em casos de dívidas. Essa lei é a de nº 8.009/90, que dispõe especificamente sobre a impenhorabilidade de bem de família.
Importante mencionar que são protegidas pela citada lei qualquer tipo de família, seja ela decorrente de casamento, de união estável, homoafetiva, monoparental (aquela constituída por um dos pais e seus filhos), ou até mesmo se o proprietário do imóvel for solteiro, viúvo ou separado. Isto porque, o objetivo é garantir à pessoa a sua dignidade e a sua moradia imobiliária, não importando o seu estado civil.
Agora que você já sabe que o imóvel que serve como sua residência é considerado um bem de família, é importante saber que ele pode ser também considerado impenhorável, ou seja, não pode ser penhorado em um processo judicial em virtude de dívidas.
Tanto é assim que o primeiro artigo da Lei 8.009/90 já deixa claro sobre essa proteção ao imóvel residencial, ou ainda, imóvel familiar:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Também é protegido contra a penhora aquele único imóvel do devedor, mesmo que ele não o utilize como moradia, mas alugue-o e utilize o dinheiro que ganha com o seu aluguel para o seu sustento e manutenção de sua vida. Esse , inclusive, é o entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça:
Súmula nº 486. É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.
E não podemos nos esquecer dos móveis e pertences que se encontram no interior da residência, visto que as ferramentas de utilidades domésticas necessárias para a manutenção do devedor e sua família também são protegidas e não podem ser penhoradas, pois estão na relação de bens impenhoráveis previstos expressamente pelo Código de Processo Civil (Art. 833, II do CPC).
Mas é claro que para toda a regra existem exceções. Há casos em que o imóvel residencial perde essa proteção da impenhorabilidade e pode ser penhorado. Um exemplo é quando o proprietário do bem o ofertar para o banco em garantia de um empréstimo, e essa garantia se der na forma de alienação fiduciária de imóvel.
Outro exemplo em que o imóvel residencial deixa de ser impenhorável é quando o seu proprietário for cobrado judicialmente por dívidas oriundas do próprio bem, como por exemplo, Taxa de Condomínio e IPTU, dentre outros.
Mas o nosso foco não são as exceções e, sim, a regra: da impenhorabilidade do bem que serve de residência para o proprietário devedor e sua família.
E se o devedor tiver mais que um imóvel residencial?
Antes de mais nada, preciso te dizer que residência é o local onde a pessoa se estabelece de maneira permanente e habitual, seja propriedade urbana ou rural. Então o imóvel onde ela mora é considerado imóvel residencial.
Ocorre que uma pessoa pode ter mais que uma residência!
Imagine que você tem uma casa em Santa Catarina, onde você passa 4 meses do ano, e um apartamento em São Paulo, onde você passa o restante dos meses. Ambos os imóveis têm caráter residencial, pois servem como sua residência.
E é diante de casos como esse do exemplo citado, de multipropriedade de bens imóveis residenciais que surgem as dúvidas.
Se o devedor tiver mais que um imóvel com caráter residencial, um deles é impenhorável? Ambos são impenhoráveis? Ou nenhum é?
A resposta é simples e nós podemos encontrá-la no artigo 5º, parágrafo único da Lei 8.009/90: nos casos em que o indivíduo ou entidade familiar possuir mais de um bem imóvel utilizado como residência, só será impenhorável aquele que tiver o menor valor.
Com isso, o devedor tem garantido o seu direito à moradia e dignidade, enquanto o credor tem garantido o seu direito de receber o seu crédito.
Mas lembre-se de que não basta apenas ser dono de vários imóveis, exigindo-se ainda que os diversos imóveis sejam utilizados com caráter residencial para que se aplique esta regra e seja reconhecida a impenhorabilidade do bem de menor valor.
E quando o devedor tem vários imóveis, mas só um deles é utilizado como residência?
Situação diferente da que falamos acima é quando o devedor possui mais de um imóvel, mas somente um deles lhe serve como moradia, enquanto os outros servem como fonte de renda, pois foram comprados para investimento, para ser alugados, ou ainda, estão vazios.
Nesse caso, a proteção legal da impenhorabilidade incidirá apenas sobre aquele imóvel que serve de residência ao devedor e sua família, independentemente do valor.
Vamos entender melhor no exemplo:
Imagine que você mora em um imóvel luxuoso e muito bem avaliado em sua cidade, mas que também possui outros imóveis que você comprou para investir, uns estão alugados a terceiros e outros estão vazios.
No seu caso, se você possuir dívidas sendo cobradas por meio de um processo judicial, o imóvel que você mora, que é a sua residência, mesmo que luxuoso e de alto valor, poderá ser protegido pela impenhorabilidade por ser um bem de família.
No caso do exemplo, a lei não previu nenhuma restrição à garantia do imóvel como bem de família em face do seu valor, dessa forma, os imóveis residenciais de alto padrão ou de luxo não estão excluídos da garantia da impenhorabilidade.
Posto isso , pode-se concluir que em eventual cobrança de dívida de forma judicial, salvo as exceções legais, o imóvel residencial do devedor e sua família é protegido legalmente contra qualquer penhora que recaia sobre ele, podendo assim, seu proprietário, sentir-se seguro quanto ao seu direito à moradia.